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                                              Album Iconográfico da Avenida Paulista


                                      TRECHO ENTRE AS RUAS AUGUSTA E PEIXOTO GOMIDE – pág. 43


    Teria o art nouveau paulistano nascido na Avenida Paulista? A indagação tem por origem a realização de uma residencia inteiramente nessa linguagem na esquina da Rua Augusta, Victor Dubugras em 1903. Sabemos que anteriormente a essa obra, a cidade já começara a ver alguns caixilhos, alguns
gradis que, com sua movimentação, traduziam a novidade vista de Paris ou de Bruxelas, designada por vezes, como style metro, arte nova, floreal e por outras formas.
    O próprio Victor Dubugras, anteriormente, realizara na Rua Caio Prado, esquina com essa mesma Rua Augusta, a Vila Uchoa, depois transformada em sede do Colegio Des Oiseaux, cujos interiores eram do mais requintado art nouveau que essa cidade conheceu. Tudo na Vila Uchoa fora desenhado
por Victor Dubugras, desde as luminárias em forma de flores pendentes de suportes espiralados até a pintura das paredes e dos forros. Nesses, a flora brasileira conheceu um magnífico registro. Nos gradis, as terminações de ferro batido se faziam em forma de coup de fouet; como os vidros eram coloridos, à
medida que o sol se deslocava, a sombra do desenho dessa ferragem associada à cor do vidro criava motivos surpreendentes nas paredes internas. E necessário registrar, entretanto, que a Vila Uchoa foi concebida na linguagem de inspiração medieval, um neo-gotico o gosto do historicismo da época, mas
com magnífico jogo de volume. Em outras palavras. Ao transpor a soleira dessa casa a visitante ingressava num ambiente regido pela arte nova.
    Não deve, portanto, ter sido difícil a Victor Dubugras convencer seu novo cliente a realizar sua residência integralmente na nossa linguagem, na nascente avenida.

    Do imprevisto e alcance da obra de Duburas podemos ter ideia por manifestações de alguns de seus alunos, surgidas nos primeiros números da Revista Politécnica, particularmente artigos de Hipólito Pujol e Augusto Toledo. Em artigo publicado no nº 3 dessa revista, de março de 1905, lemes a propósito da Vila Horácio Sabino: "Só um desenho com as cores proprias e sombras pederia mostrar e effeito da composição, porque a composição baseia-se unica e exclusivamente uma combinação racional de materiaes de tons differentes. Desappareceram todos os ornatos superfluos, para que a membramento mais se accentuasse, para que toda serenidade da estructura se manifestasse, vivamente accusuda, e servindo de pretexto a uma decoração simples e racional. Por isso, a photographia é algum tanto monótona
e, de certo modo, desagradavel. Felizmente tivemos o prazer de ver o edificio, alegremente illuminado pelo sol, num dia de belleza incomparavel; e ficamos  surpresos, admirados de effeito que se póde obter pela simples combinação de materiais diversos e sabia disposição das formas de estructura real, sem
apellar para a fonte inexgotavel de fórmas decorativas”. O texto tem algo de manifesto, uma primeira constatação de pioneirismo de Dubugras.   

     Alguns pormenores revelam influencia de Hector Guimard.  Este arquiteto realizara pouco antes a Castel Béranger na Rua La Fontaine, "a mais interessante casa art nouveau que se pode ver em Paris".
segundo Champigneulle. Apesar de ter realizado apreciável número de apartamentos naquela rua, no fim do século XIX e início deste e entre eles a originalissima residencia nº 60, todos os livros de história
da arte se limitam a reproduzir o mesmo pormenor do Castel Béranger: um arco tendo em seu interior uma coluna cujo capitel são galhos e cuja base são raizes que parecem agarrar o embasamento. Esse motivo aparece na Vila Horácio Sabino.
    O trecho da Avenida compreendido entre a Rua Augusta e a Alameda Casa Branca corresponde à antiga Chácara da Bela Cintra da qual subsistiu um levantamento (pagina 64). Algumas residências souberam tirar partido da vegetação, como a Vila Fortunata, situada na esquina da Alameda Rocha
Azevedo, projeto de Augusto Fried (19031 para Alexandre Thiollier. A implantação de casa em um dos vértices do terreno, e não em posição central, parece revelar preocupação de arquiteto e do proprietário em preservar a vegetação original (53) que se somou à vegetação da residência de Joaquim France de Mello construida ao lado, em 1905 (55), das poucas que ainda podem ser vistas na Avenida. É um segmento da mata do Caaguaçu que sobreviveu na Paulista
    Já a residência da Baronesa de Arary na esquina da Rua Peixoto Comide gozava da vizinhança privilegiada do Parque da Avenida. Foi projeto de Victor Dubugras e integra-se ao movimento da Arquitetura Tradicional Brasileira, à semelhança da residencia de Ferdinand Pierre na mesma avenida (154).
Dubugras realizou vários estudos para a Baronesa e de um deles reproducimos uma aquarela (51).
    Se examinarmos o mapa Planta Geral de São Paulo de 1897, de Gomes Cardim (13) veremos, neste trecho, o contraste entre a regularidade do setor que acabamos de examinar com o lado oposto, mais próximo do centro. Explica-se: no lado sul, temos um arruamento novo, enquanto no lado voltado à
cidade preexistiam caminhos de traçado condicionado, em parte pelo menos, pela configuração irregular do terreno. Foi nessa região que surgiu o Instituto Paulista, hospital implantado em terreno desafogado com seus pavilhões entremeados com jardins, onde se completaria a convalescença dos pacientes segundo orientação médica da época. Desse lado da Avenida e na esquina a Rua Augusta ficava o "Gymnasio" Anglo Latino assim descrito em publicação de 1924: "A sua instalação e num dos pontos mais belos e higiênicos na Avenida Paulista, em vasto e majestoso palacete, com grande e bem talhado
jardim, todo povoado de lindas flores que perfumam o ar, com recreios espaçosos e arborizados e todo conforto moderno". Esse ginásio pode ser visto na foto da página 31. Não há dúvida que a vegetação é motivo de referência em tudo que se relacione com a Avenida Paulista.
   Nesse mesmo quarteirão foi edificada uma residência de inspiração florentina (47). Foram comuns manifestações ccom esse caráter na arquitetura paulistana. Alguns eram apenas justaposição de elementos formais à procura de uma imagem evocativa da origem do proprietário. Por vezes, todavia,
essas obras surpreendiam pela desenvoltura com que eram articulados todos componentes e pelo zelo, pela execução, atingindo-se resultado de certa riqueza plástica. A residência João Dente, quase à esquina com a Rua Peixoto Gomide, parece indicar uma influencia de Dubugras em vários aspectos.
Um de seus autores, Augusto Toledo, escrevera sobre Dubugras na Revista Politécnica, como vimos, e parece ter aproveitado as lições do mestre. Mas a art nouveau tem uma característica singular: seus mestres, no geral, não tem seguidores. Explica-se: esse movimento fundamenta-se na criação individual. A Avenida Paulista ostentou na esquina da Rua Augusta a residência Horácio Sabino, a mais completa e original manifestação art nouveau que nossa cidade conheceu.

                                                                         

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